Sunday, February 11, 2007

De infernos e frustracoes

Os dias de inferno astral pre-aniversario estao acabando. Pelo menos eu os sinto cada vez mais distantes, enquanto a idade avanca e eu me sinto mais velha. Oh, melodramas. Grande besteira. Pensei muito nisso ontem. Quis ir a uma exposicao da dinastia Qing que, de acordo com o meu mapa, ficava perto da minha casa. Como era domingo resolvi antes visitar um templo que fica a duas quadras do meu apartamento. So para acertar minhas dividas com Buda antes dos meus ultimos dias (de inferno, de jovem, de Macau...). Claro que caminhei por horas sem conseguir chegar ao Templo. E o pior eh que eu podia ver a construcao sobre as casas. Lembrei da primeira coisa que aqui coloquei - as torres sobre as casas de Nietzsche. Pensando nisso, entao, resolvi me lancar no antigo habito de Kant: a "promenade". Caminhei pelas mesmas ruas que sempre caminhei. Quisera eu poder encontrar o que ele encontrou. Nao. Nao consegui chegar a exposicao tambem. Ha algo de errado com meus mapas - ou comigo. Estou convencida que eh a estupidez juvenil dos meus 22 anos. Talvez, depois de quarta, serei mais sabia. Porque a gente pensa que sabe as coisas. Eu pensei que pudesse ler mapas, ao menos. Mas acho que estive errada o tempo todo. Assim como o fantastico esteve errado sobre Macau. Aqui NAO SE FALA PORTUGUES. Juro! Tentei pedir direcoes - em todas as linguas que sei dizer "direita" e "esquerda". Frustrante. O que consegui foi um sanduiche. Depois dele, tambem desisti dos templos. Nao se deve visitar Buda de estomago cheio, pelo que sei.
Mas minha mente estava vazia. Ao contrario de Kant, perdi alguma coisa pelo caminho. Era domingo, e eu nao deveria ficar em casa escutando as mesmas musicas de sempre, folheando as mesmas velhas paginas dos meus novos livros. Resolvi sentar um pouco a beira do reservatorio que fica ao pe do meu predio. O dia nublado favoreceu a angustia de nao ser capaz de lidar com nada. Sentei la por tres horas, observando. E entao me dei conta que era isso mesmo que deveria ter feito desde o inicio. Enquanto eu pensava no envelhecimento, dezenas de chineses passavam correndo por mim. Literalmente. Ha algo de estranho neste reservatorio. Alguns equipamentos de ginastica, uma pracinha para as criancas. Quem passa por ali, aproveita para colocar o corpo em dia com a mente. Corre um pouco, faz ginastica, olha para o horizonte. Alguns tem 4 anos, outros 70. E eu pensando nos meus 23... Ora me sentia mais proxima da pracinha, ora do horizonte. Mas nao tive vontade de correr. Ate porque minha bolsa pesava muito com meu inutil mapa.
Mas entao me dei conta de uma coisa: na China as pessoas nao envelhecem. Nao como nos, ocidentais. Estamos muito preocupados com caminhos, verdades e valores. Eles, nao. Estao preocupados com Yin e Yang. Com o equilibrio. Tentei me lembrar da ultima vez que me senti em equilibrio. Foi mesmo na primeira vez que meu pai me levou a Gramado. Esperava ansiosa ele terminar o cafe, fazendo inumeros barquinhos com o jornal do dia. Eu tinha 6 anos, e foi a primeira vez que vi manteiga em bolinhas, no restaurante. Aquilo me impressionou muito. Depois disso, alguns poucos momentos.
Ha um ditado chines que diz que aquele que esta sobre a montanha nao pode ver seu contorno. Eh verdade. Eh preciso sair dela para perceber sua forma.
Neste segundo de pensamento, um senhor passa pelo meu banco, carregando a netinha sobre os ombros. Trocamos olhares. A crianca sorri. Tudo que eu pensava naquele momento ficou distante, como os anos de quando eu tinha apenas 6. Levantei e voltei para as minhas mesmas musicas.

1 comment:

pati cuozzo said...

chega, chega, chegaaa...é de cortar o coração esse post ferdi!!!
aquele nó na garganta...que dóóói e a vontade de chorar, chorar pra limpar a alma...acabei escrevendo primeiro o mail e depois vim ver o blog...nesta segunda-feira ora soleada,ora nublada, ler o teu texto...fez dela mais significante! te quiero mucho